Para os meus alunos do curso de medicina, eu sempre digo que os verbos “querer”, “poder” e “dever” são os condutores das nossas posturas morais e, por conseguinte, do nosso pensar ético.
Eu devo fazer tudo o que eu quero e, também, tudo o que eu tenho possibilidade de fazer?
O “querer” e o “poder” fornecem, somente, o arbítrio da realização do ato, porém não vincula que aquilo é o certo. Nesse caminho, mesmo que não exista nenhuma punição para o referido ato num código de conduta ou de normas, não deveremos aceitar aquilo como natural. Em outras palavras, o certo e o errado, em termos éticos, não precisam, obrigatoriamente, da positivação das leis.
Diante disso, o que podemos falar das imagens que “viralizaram” pelas mídias sociais e que mostravam um grupo de alunos de medicina com as calças arreadas, fazendo gesto de genitália com a mão e se intitulando de “pintos nervosos”?
Alguém poderia me contradizer afirmando que eu sou um radical na busca do “politicamente correto” o qual sempre é irreal.
Será?
Infelizmente, não! Quisera eu estar errado. Quisera eu ser um mero radical. O problema é maior do que se pode imaginar. Novamente, cito a professora e filósofa Jacqueline Russ. Assim, ela nos alerta: “vivemos numa era de vazio ético e sem teorias éticas introjetadas para dentro de nós”.
Não tem cabimento futuros médicos se prestarem a esse papel. Não é uma questão de brincadeira ou gozação. Estamos falando de algo sério: a medicina, o médico e a relação médico-paciente.
O médico é santo? Eu sou santo? Alguém nesse mundo mundano é santo? Claro que não! Não sejamos tolos, pois sabemos o quanto nossos desejos nos traem, contudo é preciso ter uma âncora ética. Tal ancoragem perpassa pela família, educação e, sobretudo, pela formação médica.
Precisamos repensar. O momento nos obriga a isso. A medicina e os médicos precisam resgatar essa arte. Sinto que nos perdemos. Sinto que a medicina está perdendo a sua narrativa.
Podemos tirar fotos nus? A resposta é sim. Não há uma lei que proíba isso. Nessa mesma análise, não existem proibições formais ou punições para os atos das fotos “viralizadas”. Enfim, somos livres para agir da forma que quisermos desde que a moral positivada nas leis não seja infringida. No entanto, isso é pouco quando vivemos em sociedade e nos intitulamos como seres pensantes e racionais. Há de sermos razoáveis. Há de existir em todos nós um senso crítico do certo e do errado. Há de se pensar em termos éticos e de buscar ser cognoscente.
A pergunta a ser respondida por esses futuros colegas médicos seria: por mais que não seja criminoso, eu devo fazer isso? Se não formos impulsivos, poderemos entender o quanto grave é uma atitude dessas que soa como descontraída e alegre. Cada vez mais a medicina vai caindo no descrédito social. E cada vez mais, também, temos a tendência de culpar os outros e de culpar o externo.
Ó estudantes de medicina e médicos! Qual o nosso papel em tudo isso?
Autor:
Régis Eric Maia Barros
Médico Psiquiatra CRM/DF 15031
Mestre e Doutor em Saúde Mental FMRP-USP
Psiquiatra e perito da Secretaria Psicossocial Judiciária do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT).
Professor do Curso de Medicina (UniCEUB – Brasília/DF)
Régis Barros é graduado em medicina pela Universidade Federal do Ceará e tem residência médica em psiquiatria e psicoterapia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo. Foi na Faculdade de Medicina da mesma instituição que obteve o título de especialista em Psiquiatria Social, mestre e doutor em Ciências Médicas, ambas com área de atuação em Saúde Mental. O professor também é especialista em psiquiatria pela Associação Brasileira de Psiquiatria e em Psicoterapia de Grupo pelo Instituto Enrique Pichon-Rivière de Ribeirão Preto.
Já atuou como psiquiatra do CAPS Ad de Ribeirão Preto – SP, da Prefeitura Municipal de Serrana – SP, do Hospital Psiquiátrico de Ribeirão Preto (Hospital Santa Teresa), do Ambulatório de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (Unidade de Álcool e Drogas), do Hospital Geral de Brasília e da Coordenação de Saúde da Presidência da República.
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