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Como lidar com o Burnout diante das multitarefas da mulher médica 

O Burnout é amplamente estudado em contexto de trabalho e foi definida como uma doença caracterizada pela combinação de alta exaustão emocional; despersonalização, apatia ou indiferença e baixa realização profissional, ou seja, sentimento de incompetência ou mesmo falta de utilidade.   

 

A partir da 11ª edição da Classificação Internacional de Doenças (CID), a OMS em 2022, passou a reconhecer o burnout como síndrome relacionada ao esgotamento profissional devido ao estresse crônico não administrado adequadamente.  

 

O Brasil ocupa o segundo lugar entre os países com maior incidência da Síndrome de Burnout na população economicamente ativa, perdendo apenas para o Japão.  

 

O aumento da prevalência da síndrome de Burnout nos últimos anos no Brasil pode ser explicado pela alta competitividade do mercado e tabus que envolvem o diagnóstico e tratamento precoce dos sintomas. Dados do Internacional Stress Management Association no Brasil (ISMABR), no ano de 2019, revelam que 72% da população economicamente ativa do país possuíam altos níveis de estresse e, desses, 32% desenvolveram Burnout. 

 

Sendo uma síndrome diretamente relacionada ao trabalho, ela ocorre especialmente em ambientes de alta demanda, cobrança por performance e competitividade, o que pode ser facilmente encontrado na carreira medica.  São profissionais que cotidianamente lidam com intensas emoções, sofrimento e medos, além da pressão pelo acerto e performance sem falhas.   

 

A principal causa de Burnout se relaciona a horas / volume de trabalho. Volume de trabalho excessivo, assim como jornadas de trabalho com acúmulos de horas são muito frequentes no meio médico. O Burnout entre os médicos é um fenômeno mundial. O esgotamento entre os médicos pode levar à má qualidade dos cuidados entregues aos pacientes e maior chance de erro médico. 

 

Sobre a questão de gênero, o Burnout na medicina parece atingir de forma mais comum as mulheres. Isso pode ser explicado pela maior cobrança social da mulher em desempenhar diversos papeis e atividades, para além da medicina. 

 

Como socialmente ainda há uma maior carga para a mulher nos cuidados com o lar e a família fala-se em um acúmulo de tarefas o que leva a um estado de estresse crônico, especialmente quando se associada às condições de trabalho que a mulher médica enfrenta no seu dia a dia 

 

Um estudo transcultural (Hagqvist e outros. 2017) mostrou que os pais em países com alta nível de igualdade de gênero na vida profissional (por exemplo, Finlândia) tiveram mais dificuldades na integração da vida profissional e familiar.  Nessas situações espera-se que as mães trabalhem e gerem renda como os homens, mas ainda carreguem a maior parte da responsabilidade com a vida familiar.  

 

A exaustão emocional da mulher moderna, para não ficarmos presos ao termo burnout e sua relação definida com o trabalho, nasce em uma sociedade de performance que valoriza o alto desempenho. Isso é ainda mais forte na carreira médica. A mulher é convencida de que tem que ocupar perfeitamente todos os espaços, realizando múltiplas e simultâneas tarefas. Isso pode gerar uma sensação de fracasso, já que ela não vai conseguir desempenhar tudo na forma perfeita como se exige ou se espera que seja feito.  

 

Junto com a questão de gênero temos a questão de características particulares da personalidade de cada indivíduo. Um traço comumente presente em pessoas que desenvolvem o Burnout é o perfeccionismo.  O perfeccionismo foi definido como uma tendência do indivíduo de estabelecer padrões próprios extremamente elevados e se esforçar para obter um desempenho impecável.  O perfeccionismo pode ser auto orientado, caracterizado por padrões próprios extremamente elevados acompanhados de duras autocríticas.  Há ainda o perfeccionismo externo, advindo dos arredores sociais em que o indivíduo está incluído. É caracterizado por crenças de que os outros impõem valores elevados a ele, e que ele só será aceito se alcançar esses padrões esperados em todas as atividades a que se propõe. Há o receito constante de ser avaliado de forma negativas pelo outro.   

 

Nas mulheres pode haver a criação de um ideal de perfeição no cuidado com as atividades do lar, da maternidade- de garantir que os filhos tenham o melhor da sua capacidade sendo aproveitada; a busca de perfeição com o próprio corpo, com a imagem profissional, incluindo cursos e estudos e educação contínua. Essa busca por um excesso de perfeição em todas as áreas da vida da mulher pode levar a um acumulo de tarefas, a exaustão e a um processo de Burn out. Não há espaço para falhas, o que faz o estado de estresse cônico permear todas as esferas da vida.   

 

Outro ponto a ser destacado é que algumas mulheres que tem dificuldade em pedir ajuda: tendem a achar que a forma como fazem determinada atividade é melhor ou tem outros motivos para a dificuldade em pedir apoio, como quando em sua história de vida prévia não foram reforçadas a pedir ajuda. Essas mulheres tendem a tentar fazer tudo sozinhas. 

 

Soma-se a isso ainda a dificuldade de algumas mulheres em serem assertivas e colocarem limites. Há uma dificuldade em filtrar em suas demandas, ao invés de incorporar cada vez mais responsabilidades e papéis. Destaca-se que essas pessoas de muita responsabilidade e engajamento tendem também a ser muito buscadas pelos outros para resolverem problemas externos e portanto, são visadas a receber cada vez mais responsabilidades.  

 

Um pouco a ser discutido é desenvolver a autoaceitação. Acreditar que seu valor independente do que elas fazem para os outros. Isso pode ajudar a colocar limites nas demandas e, portanto, evitar a exaustão proveniente do acumulo de muitas tarefas.  

 

Outro ponto é a psicoeducação: conhecer a doença e suas principais manifestações clínica a fim de que, se inicio de sintomas, a ajuda seja buscada de forma precoce.  

 

Ajustar as expectativas também pode ajudar a prevenir o Burnout. Ajustar a quantidade de tarefas que são possíveis de ser realizadas naquele momento, estabelecer prioridades e delegar quando necessário.  

 

Aprender a pedir ajuda e a estabelecer limites é essencial.  Para isso fortalecer a auto estima e entender que seu valor se origina apenas do trabalho ou da disponibilidade de realizar múltiplas tarefas.  

 

Lembrando que somos seres biopsicossociais, devemos lembrar das questões biológicas: realizar pesquisa de possíveis doenças orgânicas ou mesmo de ordem psicológica como a depressão, que podem se assemelhar ou mesmo se associar ao quadro de Burnout.  E da parte social, acreditar que a doença não é culpa do indivíduo, não é algo inerente a ele. Seu surgimento pode ser facilitado pelo ambiente em que ele vive na sociedade.   

 

Há de se ter cuidado para não criar um tipo de preconceito como se o Burnout acontecesse mais nas mulheres e o problema fosse no gênero feminino. No meu atendimento a mulheres percebo que as mulheres estão exaustas pelo acumulo de tarefas e pela cultura de alta performance, o mito da super mulher.  

 

A construção de resiliência, que é a capacidade de se recuperar do estresse, é frequentemente sugerida como uma estratégia contra o esgotamento entre médicos. Valorização do papel do médico, aceitar suas limitações, relações de apoio tanto pessoal quanto profissional, baseados em uma boa comunicação parecem ser caminhos para o manejo do estresse crônico.  

 

 

 

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