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Lacunas de dados deixam pesquisadores incertos acerca da gripe aviária já estar se espalhando entre as pessoas

Todos os olhos dos pesquisadores estão no Missouri. Eles aguardam ansiosamente dados do estado do centro-oeste americano, sobre uma misteriosa infecção de gripe aviária em uma pessoa, que não teve contato conhecido com possíveis portadores animais da doença. Os dados podem revelar se o surto atual de gripe aviária nos EUA em gado leiteiro, atingiu um ponto de virada temido: o surgimento de um vírus capaz de se espalhar de humano para humano.

 

Até agora, os dados da misteriosa infecção são poucos e distantes entre si: pequenos trechos da sequência do genoma do vírus H5N1, e um cronograma de infecção incompleto. Aumentando as preocupações está o fato de que nenhuma fazenda leiteira do Missouri relatou um surto de gripe aviária; isso pode ser porque realmente não há infecções, ou porque o estado não exige que os fazendeiros testem suas vacas para o vírus.

 

“O medo é que o vírus esteja se espalhando dentro da comunidade em níveis baixos, e esta é a primeira vez que o detectamos”, diz Scott Hensley, imunologista viral da Escola de Medicina Perelman da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia. “Não há dados que sugiram que esse seja o caso, mas esse é o medo.”

 

Um caso misterioso

Em 6 de setembro, autoridades de saúde pública do Missouri e os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC),anunciaram que um adulto no estado, desenvolveu sintomas como dor no peito, náusea, vômito e diarreia, e foi hospitalizado devido a outras condições médicas. Essa pessoa não ficou gravemente doente e se recuperou da infecção. Os testes revelaram que era influenza H5N1, frequentemente chamada de gripe aviária.

 

Desde março, quando o vírus H5N1 foi detectado pela primeira vez em gado leiteiro dos EUA, houve mais de uma dúzia de casos de infecção humana, que foram rastreados até o contato com animais infectados, incluindo vacas e pássaros. O caso do Missouri se destaca,porque os investigadores não encontraram tal ligação, e nenhuma outra ligação com produtos alimentícios não processados, como leite cru de gado, potencialmente infectado.

 

Isso levantou a possibilidade de que o vírus pode ter evoluído para não apenas infectar humanos, mas também se espalhar entre as pessoas. Se for assim, isso aumenta o risco de ele se espalhar por populações humanas, potencialmente desencadeando um surto perigoso.

 

Mas essa não é a única possibilidade, adverte Jürgen Richt, um virologista veterinário da Universidade Estadual do Kansas em Manhattan. “É um caso misterioso”, ele diz. “Então você tem que jogar sua rede um pouco mais longe. Talvez eles tenham limpado um alimentador de pássaros na casa. Ou será que eles foram a uma feira estadual. Ou que tipo de comida eles consumiram?”

 

Mais preocupações foram levantadas sobre o caso do Missouri em 13 de setembro, quando o CDC anunciou que duas pessoas, que tiveram contato próximo com a pessoa hospitalizada, também ficaram doentes na mesma época. Uma delas não foi testada para gripe; a outra testou negativo.

 

O resultado do teste é encorajador, mas não definitivo, diz Hensley, porque a amostra pode ter sido coletada quando os níveis virais do indivíduo estavam muito baixos para detecção, depois que eles começaram a se recuperar, por exemplo. Um próximo passo importante será testar todas as três pessoas para anticorpos contra a cepa da gripe aviária H5N1, que vem infectando o gado. Esses anticorpos, particularmente nos dois contatos, seriam evidências definitivas de infecção passada.

 

Investigação genômica

Enquanto os pesquisadores aguardam os resultados dos anticorpos, eles estão vasculhando dados de sequências genômicas irregulares, de amostras de vírus da pessoa hospitalizada. Isso pode gerar quaisquer sinais de que o vírus possa ter se adaptado a hospedeiros humanos. A busca é um desafio, no entanto: as amostras continham níveis muito baixos de RNA viral, tão pouco, que alguns pesquisadores se esquivaram de analisar as sequências completamente.

 

“O que eu gostaria de ver é uma qualidade maior”, diz Ryan Langlois, um imunologista viral da Escola Médica da Universidade de Minnesota em Minneapolis. “Estou muito desconfiado sobre interpretar qualquer coisa a partir de sequências parciais.”

 

Mas para Hensley, uma característica dos fragmentos de sequência imediatamente chamou a atenção: uma única mudança na sequência de aminoácidos, que formam uma proteína da gripe chamada hemaglutinina (o ‘H’ em H5N1). Essa proteína fica na superfície dos vírus da gripe, onde ajuda os vírus a se ligarem e infectarem células hospedeiras. Também é um alvo das vacinas contra a gripe.

 

A mudança que Hensley encontrou, cria um local ao qual uma grande molécula de açúcar pode se ligar. Esse açúcar, ele diz, poderia então agir como um guarda-chuva, protegendo a faixa de hemaglutinina abaixo dele. É uma mudança que seu laboratório estudou em outras cepas de gripe, e pode afetar como o vírus se liga às células hospedeiras,bem como as vacinas que estão sendo desenvolvidas contra o vírus H5N1 encontrado em gado, podem reconhecer e ter um bom desempenho contra o vírus detectado no Missouri.

 

Lacunas de vigilância

Mesmo que as sequências estivessem disponíveis, os pesquisadores sabem pouco sobre quais mudanças genéticas podem permitirm que os vírus da gripe aviária infectem melhor os humanos ou se tornem aerotransportados, diz o virologista Yoshihiro Kawaoka da Universidade de Wisconsin-Madison. Estudos anteriores sugeriram que mudanças em um gene, que codifica uma proteína responsável pela cópia do genoma viral, podem ser cruciais para permitir que o vírus se replique em células de mamíferos. Mas os pesquisadores não conseguiram sequenciar esse gene do isolado do Missouri.

 

Enquanto isso, o CDC emitiu contratos para cinco empresas nos Estados Unidos, para fornecer serviços de teste para H5N1 e outros patógenos emergentes. Os testes de gado também precisam ser melhorados, para que as autoridades de saúde pública saibam quais regiões do país devem ser monitoradas para infecções em humanos, diz Seema Lakdawala, virologista da Universidade Emory em Atlanta, Geórgia. Nos Estados Unidos, a maioria dos testes de gado é regulamentada em nível estadual, mas apenas um punhado de estados exigiu testes de rotina em algumas fazendas leiteiras.

 

Os profissionais de saúde pública ainda não têm uma boa noção de quantos rebanhos dos EUA têm vacas infectadas com H5N1, ou se o gado tem imunidade após contrair gripe aviária ou pode ser reinfectado, ela diz.

 

Enquanto os pesquisadores esperam por mais informações, Hensleyalerta contra o pânico. “Isso ainda pode ser um caso isolado e não o sinal de algo maior”, ele diz.

 

Referente ao artigo publicado em Nature

 

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