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Por dentro do Centro Mundial da Gripe: monitorando a ameaça constante da gripe e de outros vírus

“A ameaça da gripe não desapareceu e não foi embora, mesmo quando tivemos uma pandemia de Covid-19”, diz a Dra. Nicola Lewis.

Tendo ingressado no Francis Crick Institute no ano passado, vindo do Royal Veterinary College, Lewis é especialista em ecologia e evolução dos vírus influenza, e passou anos observando sua disseminação em animais, e os riscos que representam para a população humana. Ela agora dirige um dos sete maiores centros do mundo responsáveis pela análise dos vírus influenza, parte do Sistema Global de Vigilância e Resposta à Influenza: uma rede de 150 laboratórios, que monitoram continuamente os vírus influenza em todo o mundo, testando milhões de amostras e centenas de milhares de vírus a cada ano.

“Eu diria que o centro de colaboração do Instituto Francis Crick aqui em Londres, tem a maior presença geográfica em termos de onde coletamos amostras. Trabalhamos rotineiramente com aproximadamente 50 a 90 centros nacionais de gripe”, explica Lewis. “Eles nos enviam espécimes clínicos e vírus, e então o que fazemos é caracterizá-los, então vamos sequenciá-los e analisá-los por suas propriedades antigênicas, e também analisá-los em termos de potencial de sensibilidade ou resistência antiviral”.

A partir daí, ela e sua equipe levam essas informações para as reuniões semestrais do vírus influenza sazonal da Organização Mundial da Saúde, onde o painel de especialistas faz recomendações para os vírus vacinais, candidatos da próxima temporada. Mas isso é apenas uma parte do que o centro faz. A outra é avaliar os vírus influenza que circulam em populações animais, e considerar o risco que podem representar para a população humana, e principalmente, se têm potencial pandêmico.

A ameaça da gripe e de outros vírus

Até 650 000 pessoas em todo o mundo, morrem de doenças respiratórias ligadas à gripe sazonal. O mundo enfrentou três grandes pandemias globais de gripe no século 20, e acredita-se que a pandemia de gripe suína H1N1 de 2009, tenha ceifado até um quarto de milhão vidas.“Se parceiros colaboradores em países ao redor do mundo detectam um vírus influenza animal que infectou um ser humano, eles compartilham o material conosco e nós o analisamos”, diz Lewis. “Temos estado inerentemente envolvidos não apenas nos vírus da gripe aviária, mas também nos vírus da gripe suína, que são detectados periodicamente na população humana. Todos esses vírus em animais continuam a representar uma ameaça zoonótica significativa”.

Lewis e sua equipe analisam as propriedades dos vírus, incluindo qual resposta imune eles desencadeiam, e como eles se comparam com a lista de vírus vacinais candidatos que já foram recomendados, para preparação pré-pandêmica.

Ela diz: “Se houver diferenças significativas em relação aos vírus vacinais candidatos que já recomendamos, às vezes há um movimento para atualizar uma recomendação, e fazer uma nova recomendação para vírus específicos, que são potencialmente arriscados”.

Além disso, eles analisam os genomas dos vírus em busca de possíveis marcadores que possam sugerir que os vírus estão mudando e, com isso, o risco que representam. “Essa é uma coisa complicada de se fazer”, diz Lewis. “Muitas vezes as mudanças estão associadas a um determinado tipo de vírus e, embora possam ter sido compreendidas experimentalmente em um determinado vírus, nem sempre podemos ter certeza de que as mesmas mutações terão o mesmo efeito em vírus, que continuaram a se espalhar, e continuaram a evoluir em populações animais”.

No início deste ano, Jeremy Farrar, novo cientista-chefe da OMS, disse ao The BMJ que os governos deveriam investir em vacinas para cada cepa de influenza existente no reino animal, por meio de pelo menos estudos de fase 1 e 2.

Lewis concorda. Para ela, sem pelo menos algum nível de ação a lista de vírus candidatos a vacinas, que consome muito tempo e recursos todos os anos, “fica apenas como uma lista de desejos, não tem utilidade, e isso não nos leva adiante nos trilhos da preparação para uma pandemia.” Existem muitas questões primárias não respondidas, sobre questões como se as vacinas candidatas poderiam fornecer proteção cruzada contra uma variedade de clados ou cepas circulantes.

E avaliar até mesmo todos os vírus influenza seria um desafio. “É um empreendimento enorme”, admite Lewis. “Mas, se não o fizermos, não teremos as informações para tomar decisões informadas sobre o que fazemos para a preparação para uma nova pandemia.”

Pandemias futuras “inevitáveis”

Para Lewis, outra pandemia não é uma questão de se, mas de quando. “Enfrentamos uma ameaça constante de doenças infecciosas emergentes”, diz ela. “Eu certamente acho que, tenho medo de dizer, futuras pandemias provavelmente são inevitáveis.”

Com isso em mente, avaliar o que aconteceu durante a pandemia da Covid-19 é vital. “Realmente precisamos dar uma olhada longa e cuidadosa, no que podemos aprender com a pandemia da Covid-19, e a resposta a ela”, diz ela. Sua esperança é que esses aprendizados, bem como o que podemos tirar do Sistema Global de Vigilância e Resposta à Influenza nos últimos 70 anos, possam significar que da próxima vez que enfrentarmos uma pandemia, não teremos que enfrentar os piores efeitos.

Mas ela não está totalmente esperançosa, especialmente quando se trata de pesquisa e diagnóstico. “Se você olhar para doenças infecciosas emergentes, uma das coisas iniciais de que você precisa são diagnósticos sensíveis”, diz ela. “Alguns dos desafios iniciais nas primeiras semanas e meses da pandemia da Covid-19 podem fazer muito para iluminar o que precisamos fazer na próxima pandemia. Não estou totalmente convencida de que nos lembramos desses desafios, e que estamos pensando em como fazer melhor no futuro”.

Ela compartilha as preocupações de muitos pesquisadores que acreditam que, ao reduzir, em vez de aumentar as redes de pesquisa e o sistema de vigilância construídos durante a pandemia, estamos perdendo uma grande oportunidade de progredir em nossa preparação.

“Estamos em um momento crítico aqui, onde francamente não podemos interromper o processo”, diz Lewis. “Não podemos deixar de aproveitar esta oportunidade para aprender o que pudermos com a pandemia da Covid-19, para garantir que estaremos melhor preparados da próxima vez. Porque haverá uma próxima vez, e estou muito preocupada que uma retração de financiamento de curto prazo, basicamente interrompa o processo.”

Ela conclui: “Há uma enorme diversidade na população animal em termos de influenza, seja na população de aves ou na população de suínos. E qualquer um desses vírus pode iniciar a próxima pandemia.”

 

Referente ao Artigo publicado em British Medical Journal.

 

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