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Direito e Ética Médica na Emergência

A “Emergência” se refere, etimologicamente, aquilo que “Emerge”. Um fato que subitamente advém e que reclama uma resposta imediata. As “Emergências Médicas” albergam, não raro, ocorrências dramáticas, clínicas e/ou cirúrgicas, nas quais a capacitação e necessária intervenção estão inseridas no lidar com a tênue linha que distingue o “morrer” e o “manter-se vivo”.

 

Sob o prisma da Ética Médica, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e diversos Conselhos Regionais de Medicina (CRM) já se manifestaram sobre o tema. Se não, vejamos:

 

(1) Resolução CFM 2.077/2014 – Dispõe sobre a normatização do funcionamento dos Serviços Hospitalares   de   Urgência   e   Emergência, bem   como   do dimensionamento da equipe médica e do sistema de trabalho.

 

Salientamos:  a necessária implantação do setor de acolhimento, com classificação de risco; o compulsório atendimento por médico, não podendo ser dispensado ou encaminhado para outra unidade por outro profissional de saúde; obriga a qualificação, com certificação específica, do profissional de Medicina que trabalha em tais serviços (nos termos de Portaria 2048/2002 do Ministério da Saúde); o tempo máximo de permanência do paciente, no setor, não poderá exceder as 24 horas. A partir de então, deverá receber alta, ser internado ou transferido. O quantitativo de plantonistas médicos deverá considerar o volume de atendimentos anuais, sem contabilizar a presença de médicos residentes ou internos do serviço.

 

 (2)  Resolução CFM 2.079/2014 – Dispõe sobre a normatização do funcionamento das Unidades de Pronto Atendimento (UPA) 24h e congêneres, bem como do dimensionamento da equipe médica e do sistema de trabalho nessas unidades.

 

Assume destaque: as UPA são unidades de assistência intermediária. Situam-se entre as Unidades Básicas de Saúde/Saúde da Família/“Postos de Saúde” e a rede hospitalar. A exemplo dos hospitais, deverão dispor de sistema de classificação de risco; avaliação obrigatória por médico, além de um sistema de fluxo dos pacientes, normas para quantificação da equipe médica necessária ao trabalho local e certificação do profissional para trabalhar em tais serviços. Temas como a indispensável passagem de plantão para a equipe sucessora, o tempo máximo de demora na unidade, os adequados registros nos documentos médicos, além da transferência na “vaga zero” são abordados no dispositivo. É vedada a internação na UPA. O paciente deve ser adequadamente avaliado e encaminhado, ou ainda, com alta no próprio serviço. Oportuno destacar a relevância de Comissões nas UPA, compostas pelos profissionais que nela atuam. São exemplos: Comissão de Revisão de Prontuários, Comissão de Revisão de Óbitos, Prevenção de Acidentes, Segurança do Paciente e Comissão de Ética Médica.

 

(3) Resolução CFM 2.110/2014 – Dispõe sobre a normatização do funcionamento dos Serviços Pré-Hospitalares Móveis de Urgência e Emergência, em todo o território nacional.

 

Ressalta-se desta normativa: trata-se de serviço médico e, portanto, deverá dispor, a exemplo das unidades hospitalares e das UPA, de um diretor clínico e um diretor técnico registrados no CRM da circunscrição. As comissões citadas no item anterior também se aplicam aos serviços de que tratam esta resolução, que tem o SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – 192), como exemplo notório, além das instituições privadas que realizam tais atendimentos. Devem, obrigatoriamente, priorizar os atendimentos primários em domicílio, ambiente público ou via pública, por ordem de complexidade. Não é sua atribuição o transporte de pacientes de baixa e média complexidade, assim como o transporte de pacientes para realizarem exames complementares. O número mínimo de médicos reguladores e de ambulâncias capaz de atender a demanda de uma determinada região está dimensionado na Portaria GM/MS nº 1010/2012. A responsabilidade pelo preenchimento da Declaração de Óbito (DO), por ocorrências durante o transporte, estão disciplinadas na Resolução CFM 1.779/2005.

 

Ao adentrarmos os aspectos inerentes ao Direito Médico, neste contexto das “Emergências Médicas”, impende distinguir:

 

Alegações de Omissão de Socorro (art.  135 do Código Penal – CP) poderão ser avocadas. Aplica-se a qualquer cidadão e, portanto, médicos ou não, tem obrigação de prestar auxílio, na medida da sua capacidade e possibilidades, independentemente do local onde se encontrem. No mesmo códex, o art. 135-A prevê a conduta criminosa de “Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial”, é dizer, exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial, tendo pena aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resultar lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resultar morte.

 

Também incorre em crime (art. 257 do CP) quem gera obstáculo na prestação do socorro – impedindo-o ou dificultando-o – ao subtrair, ocultar ou inutilizar, aparelho, material ou qualquer meio destinado a serviço de combate ao perigo, de socorro ou salvamento.

 

Tão relevantes quantos os tópicos elencados, deve-se observar, no que couber, as “Diretivas Antecipadas de Vontade (Resolução CFM 1.995/2012), incluindo os assistidos em situação de cuidados paliativos ou com desejo de “não-reanimação cardiopulmonar” ao ser atendido no “Setor de Emergência”, além das “equipes de captação” no contexto da “Doação e transplantes de órgãos e tecidos” (Capítulo VI do Código de Ética Médica).

 

No Brasil, a especialidade “Medicina de Emergência” é recente. Em 1996, a primeira residência médica foi instituída em Porto Alegre/RS. Em 2007, o primeiro Congresso Brasileiro acontece em Gramado, no mesmo Estado. Em 2008, a segunda residência é criada em Fortaleza/CE. No ano seguinte, a capital alencarina sedia o 2º Congresso Brasileiro (também receberia a 6ª edição, em 2018). O CFM reconhece a especialidade em 2013 e a Associação Médica Brasileira (AMB), em 2015.

 

In fine, sem a pretensão de esgotar o tema, a situação de “Emergência Médica” traduz o seu humano em sua fragilidade, clama por empatia e oportuna ação dos que o cercam. No limite da vida-morte, recorde-se o poema épico de 15 mil versos, “Ilíada”, do grego Homero (700 a. C.), ao indagar: “Quanto vale a vida de um homem?”. 

 

 

Autor: Prof. Dr. Renato Evando
Médico e Advogado – CRM/CE 6921 OAB CE 22667
Prof. Dr. de Medicina Legal, Ética Médica e Direito Médico da UFC

 

Artigo publicado na revista digital do Jornal do Médico, ANO II, Nº 17.

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